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terça-feira, 9 de novembro de 2010

Artigo- O desenvolvimento do mercado de capitais e o novo governo

Autor: Roberto Gonzalez

No último dia 31 de outubro, mais de 55 milhões de brasileiros escolheram a continuidade do atual governo. O momento é impactante para a nossa democracia: desde o período do “café com leite”, é a primeira vez que o presidente escolhe seu sucessor e este é eleito. Se formos analisar com profundidade, somos hoje, entre os países emergentes, a democracia mais sólida. Para que este momento continue a crescer é necessário atuar em várias frentes e uma delas é desenvolver mais o nosso mercado de capitais, inclusive com a inclusão da nova classe média brasileira.

A partir de 1º de janeiro de 2011, Dilma Rousseff assume como chefe de governo e de estado e pode aproveitar uma oportunidade única: o Brasil é cada vez mais um porto seguro, já que, do ponto de vista de investimentos estrangeiros. Além disso, o País aumenta a poupança interna, que pode ser, pelo menos parte dela, capitaneada para o mercado de capitais.

É inevitável salientar que o atual governo foi um dos estimuladores do mercado de capitais, porém é preciso caminhar mais e algumas ações podem ser ampliadas. Uma das formas para que isso ocorra é o fortalecimento das práticas de governança corporativa e de sustentabilidade nas empresas brasileiras. Assim, o país, que agora não é mais do FUTURO e sim do PRESENTE, estará mais próximo da sociedade brasileira.

A nova Presidente pode forçar sua equipe econômica a dar um maior apoio estrutural e técnico à CVM (Comissão de Valores Mobiliários) que já vem desempenhando um excelente papel para o desenvolvimento da governança corporativa no País. Como exemplo, o Formulário de Referência, instituído pela Instrução CVM nº 480/09 – documento que substituiu o antigo IAN (Informe Anual) – foi um ótimo avanço, pena que algumas empresas não entenderam o seu verdadeiro papel e entregaram na mão de advogados a prestação de contas da gestão. Além disso, a instrução CVM nº 481/09 também contribuiu para o processo democrático dentro das companhias, afinal democracia atrai democracia.

Agora, no que tange à sustentabilidade, seja na esfera governamental ou privada, falta ao Governo Federal um maior envolvimento, inclusive o próprio órgão regulador do mercado de capitais tem um trabalho irrelevante nesse tema. É necessário um maior envolvimento, afinal a CVM pode, através de seus atos normativos, impulsionar uma maior prestação de contas da sustentabilidade das companhias, já que isso pode afetar a decisão de investimento. O caso da BP no golfo do México é um grande exemplo disso.

Podemos dizer, ainda, que a pressão do órgão regulador irá contribuir para diminuir a quantidade de “firulas” nas informações socioambientais disponibilizadas pelas empresas, fazendo com que estas tenham o mesmo peso que as informações econômico-financeiras. Assim que as informações socioambientais forem mais consistentes, mais atreladas ao desenvolvimento do negócio e verificadas externamente, (já que estarão presentes também nas demonstrações contábeis), os profissionais de investimento, sejam analistas de rating, crédito ou investimento, as utilizarão mais, tornando-as, assim, mais relevantes às praticas atreladas a sustentabilidade e às decisões estratégicas das companhias.

 Com uma atuação mais efetiva da CVM nessas questões, poderemos ter um maior número de relatórios corporativos que retratam a sustentabilidade. Se verificados externamente, ganharão maior consistência, confiabilidade e qualidade, e poderão ser utilizados por agentes que ainda não enxergaram valor nessas informações. Ou seja, este documento atenderia aos anseios dos públicos usualmente ligados à sustentabilidade, bem como dos profissionais do mercado financeiro.

É importante fazer um parêntese, pois os agentes do mercado também tem um papel altamente relevante nesse processo. O CPC (Comitê de Pronunciamentos Contábeis), por exemplo, poderia editar pronunciamentos sobre o tema, já que existe uma oportunidade do Brasil sair na frente na integração das informações “CONTÁBIL/SUSTENTABILIDADE”. Ainda não sei o porquê do comitê não estar sensibilizado com o tema. Afinal, a academia debate o assunto; vários profissionais de investimentos querem que seja demonstrado como essa temática pode impactar na valorização; a Bolsa tem um índice de sustentabilidade;  praticamente todas as auditorias já tem áreas destinadas a tratar da  sustentabilidade; e os contadores começam a entrar na discussão de como contabilizar.

Acredito então que contribuiria, e muito, se o Governo fosse engajado no tema, afinal mesmo que não sejam membros do CPC participam como convidados: a CVM, o Banco Central, a Receita Federal e a Susep (Superintendência de Seguros Privado). As entidades do mercado que formam esse Comitê poderiam ficar mais sensibilizadas à questão, pois o momento é oportuno. Podemos assim, demonstrar ao IIRC (International Integrated Reporting Commitee) como fazer esta integração, pois o histórico do País é um dos mais avançados, mesmo com a resistência de alguns profissionais.
Com tudo isso, o caminho natural dentro das companhias será o de ter conselheiros comprometidos com a temática, afinal as decisões mais estratégicas são tomadas pelos Conselho de Administração das Companhias e é sabido que não adianta criar comitês de sustentabilidade dentro dos conselhos se as pessoas que os compõem não entendem nada do assunto. Isso é a mesma coisa que ter no comitê de auditoria somente médicos que nunca ouviram falar sobre finanças.

Nessa realidade, a Sustentabilidade entra na agenda dos conselhos de administração, o que não acontece hoje, mas, com o aumento da cobrança por parte do mercado, será natural que o IBGC (Instituto Brasileiro de Governança), abra um espaço maior para tratar do tema, ampliando o papel do Cese (Comissão de Estudos de Sustentabilidade para as Empresas).

Podemos então concluir que, caso o futuro Governo Federal e sua principal mandatária Dilma Rousseff, efetivamente se comprometerem com a governança corporativa, com a sustentabilidade e em atuar com esses conceitos no aprimoramento e crescimento do nosso mercado de capitais, o Brasil iniciará os passos para terminar o século XXI como a potência da economia sustentável, ou seja, da nova realidade global.



Publicado na Revista RI  n° 148 – novembro de 2010